É possível viver da bolsa?

Sim, é possível. Mas se você está considerando esta possibilidade, antes de comemorar, largar seu trabalho e entrar de "peito aberto" no mercado, é bom saber que existem diversas condicionantes. Viver da bolsa é tarefa das mais árduas, exigindo do pretendente muito estudo, dedicação, disciplina, boas ferramentas de análise, um trading system eficiente, além de controle emocional e uma  boa quantia de recursos financeiros disponíveis. Outras fontes de renda, como alugueis,  ou salário de um cônjuge também são desejáveis (para não dizer indispensáveis). Caso você atenda a todas essas condições, ainda há outras questões a considerar, tais como: Vale à pena? Tenho o perfil necessário? Será que esse trabalho explora ao máximo minha capacidade de produzir renda?

$ Acabando com as ilusões
Ser trader é, antes de tudo, uma atividade extremamente trabalhosa, metódica, repetitiva e solitária. Se uma de suas motivações é o sonho de trabalhar pouco e viver dos frutos de seus negócios na bolsa, o que deseja de fato, mesmo que ainda não saiba, é se aposentar e virar investidor. Você nunca será um profissional autônomo no mercado com objetivos como esse. 

Não se iluda com promessas de ganhos rápidos e fáceis. Um bom trader operando de forma regular vai conseguir, no máximo, de 2% a 4% de rentabilidade média, tendo inclusive rentabilidade negativa em alguns meses. Qualquer coisa além disso é "conversa fiada". Se não acredita, basta conversar com outros profissionais do mercado, professores de análise técnica, consultores ou mesmo operadores. Se mesmo assim acreditar que pode conseguir um resultado melhor, o mercado vai mostrar que você está enganado. Em renda variável, como em tudo na vida, não tem "almoço grátis".

$ Dificuldades adicionais
Como se não bastassem as dificuldades já descritas, existem algumas outras. Posso garantir que a maior vai ser o fato de estar operando com o próprio dinheiro. Já conversei com operadores que, mesmo sendo profissionais do mercado, entregam a gerência de seus próprios recursos ao operador da mesa ao lado. Isso não acontece por não confiar nas próprias análises ou por preguiça, mas sim pela dificuldade em manter sobre controle o fator emocional. Parece uma tarefa simples, mas como veremos num artigo futuro, o aspecto emocional é o mais importante e perigoso para um trader. Você lidará com a pressão adicional de não perder (o SEU) dinheiro, além de não ter um "chefe" que indique um limite para suas perdas. Muitas vezes você será tentado a alterar uma estratégia ou desativar um stop, o que na grande maioria dos casos se reverterá em prejuízo. É preciso ter em mente que um único trade errado pode comprometer o trabalho de um mês inteiro (ou mais). Trader não pode se dar ao luxo de errar. Por isso que a curva de aprendizado em um simulador da bolsa é mais eficiente do que as do que partem direto ao mercado. Quando é pra valer, as coisas podem se complicar. Daí a necessidade de se ter uma outra fonte de renda, essa sim vai manter sua tranquilidade nos dias ruins para continuar trabalhando.
Outra dificuldade é se manter focado e motivado, sobretudo quando ocorre algum revés referente à fatores externos. Para resolver essa questão, a dica é estabelecer metas e persegui-las, estipulando pequenas premiações para você mesmo de tempos em tempos. Essas metas podem ser desde jantares até viagens de férias ou a aquisição de um novo carro.


$ Difícil, mas não impossível
Investidores mais céticos acreditam que mesmo a meta de 2% é improvável  e/ou inviável, pois "ninguém consegue bater o mercado". É verdade. Algumas das mentes mais brilhantes do mundo já demonstraram, por meio de vários estudos e de forma clara, não ser possível superar o mercado (como dito na reportagem da página 9 da Revista Invista de nov-dez/2010). Mas não é de vencer o mercado que se trata quando somos traders, e sim extrair a remuneração que seu tempo, ferramentas e conhecimento lhe proporcionam. Não podemos por na mesma base de comparação um trader isolado e a amplitude do mercado como um tudo, ou mesmo com os grandes Investidores institucionais. Costumo traçar um paralelo esclarecedor: Um trader é como uma bicicleta e o mercado é como um transatlântico. Quem manobra mais rápido?

$ Tenho o perfil adequado?
Adoro belas telas, mas jamais saberei manusear um pincel com maestria. Ou seja, apenas gostar de fazer operações na bolsa não o qualifica para ser um trader. É preciso que você se questione de forma honesta sobre sua capacidade de realizar esse tipo de trabalho. Caso não esteja obtendo sucesso após alguns meses, considere abrir um negócio com seu capital ou mesmo arranjar um emprego. Isso não o diminuirá em nada, já que não é uma questão de inteligência, capacidade ou tenacidade. É uma questão de perfil.
 

$ Vale à pena?
Essa é uma questão de foro íntimo e que também deve ser respondida com honestidade. Se você não se sentir realizado com esse tipo de trabalho e sua única motivação é ganhar dinheiro, não precisa continuar a ler esse artigo, pois no seu caso não vale à pena. Claro, satisfação pessoal também conta, mas não é tudo. O fato de você estar tendo resultados satisfatórios (o que por si só já é muito difícil) não significa que deve seguir na atividade. Você deve ponderar se esta é a forma mais eficiente de rentabilizar seu capital e seu tempo. Se você é, por exemplo, um médico, engenheiro ou advogado, será que seu tempo não seria melhor remunerado na profissão de origem? Será que investindo seu capital de outras formas o retorno não seria maior com menos esforço? Pense nisso.

$ Disponho dos recursos necessários?
Uma dúvida recorrente entre os que sonham em viver da bolsa é quanto ao capital necessário. Uns falam em R$ 100.000,00 (cem mil), outros em R$ 1.000.000,00 (um milhão), e ainda otimistas que acreditam ser possível mesmo com R$ 10.000,00 (dez mil). Nesse artigo trago a resposta definitiva, que é: depende. Na verdade, tudo se resume à sua necessidade de retirada mensal. Se você precisa de algo como R$ 5.000,00 por mês, um capital de R$ 300.000,00 deve ser suficiente. Não faça projeções com ganhos maiores que 2% a.m. sob pena de dilapidar seu patrimônio.

$ Considerando os custos envolvidos
Deve-se tomar cuidado para não confundir rendimento com resultado, o que será fatal no longo prazo. Ser trader é como ter uma empresa. Para apurar os resultados, você precisa levar em consideração os custos envolvidos. Só após abater esses é possível saber sua remuneração líquida. Ou seja, temos que subtrair as despesas operacionais, tais como: corretagens, taxas, emolumentos, energia, plataforma de análise gráfica, imposto de renda, internet, além da remuneração de seu capital para dirimir os efeitos da inflação (remunero em 0,8%). Fazendo as contas você vai perceber que esses custos podem ser de 1 a 2%, dependendo do capital disponível.

$ Qual estrutura preciso ter e manter?
Uma sala em algum lugar ou um home office são imprescindíveis, além de um computador confiável (de preferência com múltiplos monitores) e de acesso à internet em banda larga. Também é necessário assinar uma boa plataforma de análise técnica com cotações em tempo real e manter conta em uma boa corretora, que forneça serviços avançados como venda a descoberto direto pelo home broker, com baixo custo por ordem executada. Desnecessário dizer que um trade system com backtest eficiente e um manejo de risco bem ajustados são obrigatórios.

$ É, estou pronto 
Se você considerou todos os pontos aqui descritos e mesmo assim se considera apto à viver da bolsa, seja bem vindo. A despeito do que muitos possam dizer, é uma atividade lícita e nobre como qualquer outra e que, quando levada à sério, pode ser vantajosa em diversos aspectos. Boa sorte, trader!

Já tentou, está tentando, conseguiu, desistiu ou pretende viver da bolsa?... Então, conte aqui sua estória.